quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Comunidade Dandara quer que estado desaproprie terras

A desapropriação das terras pelo Estado é a principal solução defendida pelos moradores da Comunidade Dandara, em Belo Horizonte, para garantir a permanência de cerca de mil famílias no local. O assunto foi discutido durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais nesta quarta-feira (23/11/11).

Uma decisão expedida pela 20ª Vara Cível, em setembro deste ano, determinou o despejo dos moradores da comunidade, em resposta à ação de reintegração de posse da área da Construtora Modelo. Por sugestão das autoridades presentes na audiência, uma reunião técnica foi agendada para o dia 6 de dezembro, na Assembleia, com o objetivo de estabelecer uma negociação entre representantes do poder público, da construtora e da comunidade, de forma a encontrar uma solução para o conflito.

O advogado-procurador da Comunidade Dandara, Joviano Gabriel Maia Mayer, destacou o empenho da comunidade, que há mais de dois anos tenta encontrar uma saída negociada para o problema dentro do que prevê a legislação. Mayer exemplificou que, no curso da ação de reintegração de posse, uma das exigências feitas pela Construtora Modelo como condição de negociação seria a verticalização da área ocupada pelas famílias, por meio da construção de apartamentos. De acordo com o advogado, embora a proposta não fosse a mais adequada para a comunidade, os moradores teriam aceitado a condição imposta pela construtora. Mesmo assim, as partes não chegaram a um acordo.

Mayer ainda cobrou uma ação mais firme por parte do Governo para resolver a questão. “ A construtora pede o nosso despejo, mas para onde nós vamos? Esperamos que o Estado e o município tenham serenidade de tomar uma atitude. E a solução mais viável seria a compra do terreno pelo poder público, para garantir a moradia para essas pessoas”, argumentou.

Ação de despejo é classificada como injusta

A desapropriação da terra também foi defendida pelo assessor da Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais, frei Gilvander Luís Moreira. Ele ainda criticou a ação judicial que determinou a saída dos moradores da comunidade da área, classificando-a como “injusta, imoral e covarde”. Moreira afirmou que, antes de ser ocupada, a propriedade não era utilizada e estava ociosa há vários anos. Ao expedir um mandado de despejo, o Judiciário não considerou a função social da área, que hoje abriga cerca de 5 mil pessoas. “Não há como colocar essas pessoas na rua. Além disso, esses problemas não podem ser resolvidos com repressão”, disse o assessor, que também cobrou a apuração do que ele chamou de terrorismo psicológico por parte da polícia, ao amedrontar e ameaçar os moradores da comunidade.
Para a representante da Comunidade Dandara, Rosimar Ione dos Santos, as famílias que ocupam a área localizada no bairro Céu Azul, região da Pampulha, o fazem por necessidade e porque não têm para onde ir, caso sejam despejadas. Ela também cobrou que os direitos dos moradores sejam respeitados. “O que procuramos é uma moradia digna”, comentou Rosimar.

Defensoria, Ministério Público e Prefeitura de Belo Horizonte também opinam

Para a coordenadora da Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais, Cleide Nepomuceno, independentemente de uma solução judicial, o problema da Comunidade Dandara deve ser resolvido por meio da construção do diálogo entre todos os atores envolvidos e responsáveis pela questão. Segundo Cleide, a Defensoria Pública tem prestado toda a assistência jurídica à comunidade, incluindo um recurso contra o mandado de despejo , bem como o ajuizamento de uma ação cívil pública. No seu entendimento, o caso deveria ser tratado no âmbito da vara pública, e não da civil, como tem sido feito, de forma a envolver o Estado como responsável pela garantia do direito à moradia das pessoas.

O procurador de justiça do Ministério Público de Minas Gerais, Afonso Henrique de Miranda Teixeira, também defendeu a responsabilização do Estado na busca por uma solução para o conflito. O procurador ainda classificou a luta dos moradores da comunidade como legítima, uma vez que, na sua avaliação, a área em questão só pode ser destinada àqueles que dela necessitam.
O compromisso da Prefeitura de Belo Horizonte com as famílias que não possuem casa foi destacado pela diretora de planejamento da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel), Maria Cristina Magalhães. Segundo ela, a prefeitura tem estimulado um acordo entre os representantes da Construtura Modelo e a comunidade Dandara.

Crítica à violência - Para o deputado Durval Ângelo (PT), que solicitou a audiência, a solução do problemas depende, principalmente, da Prefeitura de Belo Horizonte. O deputado ainda apontou como possível solução para o conflito a cessão de parte do terreno pela construtora, o que, segundo ele, seria uma alternativa, caso não seja feita a desapropriação das terras. Por fim, Durval ângelo criticou o uso da violência e da repressão como método de solucionar o problema. “ Não podemos tratar a questão da moradia como caso de polícia. Os movimentos sociais devem ser tratados com cidadania”, afirmou.

Requerimentos 

Ao fim da reunião, que foi suspensa e retomada na parte da tarde, foram aprovados requerimentos do deputado Durval Ângelo (PT): ao prefeito de Belho Horizonte e o governador do Estado, sugerindo a desapropriação da área onde se localiza a Comunidade Dandara como de interesse social e solicitando o agendamento de reunião com representantes das partes envolvidas no conflito, de forma a buscar uma solução concreta para o problema; o encaminhamento das notas taquigráficas ao governador do Estado; ao prefeito de Belo Horizonte; à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; ao Ministério das Cidades; à Secretaria de Estado de Governo; à Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG; ao Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humansos; ao presidente do Tribunal de Justiça e às autoridades presentes na audiência pública. Outro requerimento aprovado solicita o registro nos anais da Assembleia do artigo “Ocupar é Invadir”, de João Paulo Cunha, publicado no jornal Estado de Minas, além de encaminha ao jornalista manifestação de aplauso pelo artigo.

O último requerimento solicita ao presidente do Tribunal de Justiça o agendamento de reunião com representantes e procuradores da Comunidade Dandara, para construir uma solução que garanta os direitos humanos das famílias.